A perfeição só voltou a meio do curso quando comprei um caneta Rotring Rive, ainda consegui descobrir uma numa papelaria perdida em Odivelas, daquelas que a gente entra e está cheia de coisas antigas nas prateleiras, dossiers com anos amontoados no cimo dos armários, livros que parece que nunca ninguém abriu...
É uma caneta diferente de todas as outras que eu já vi, com um aspecto fantástico e mirabolante - preta, cilindrica, o corpo cheio de covinhas como as bolas de golfe, sempre pronta a rebolar em cima da mesa a caminho do chão. Quem no seu perfeito juizo se lembraria de criar uma caneta com este aspecto? E no entanto, assenta perfeitamente na minha mão, é proporcionada, o peso adequado, o aparo de aço caracteristico da Rotring, rijo mas escorregadio, sem dificuldades em fazer fluir a tinta, não me canso de escrever com ela. Quando me distraio até costumo encaixar o dedo na tampa e fico como que com uma unha à feiticeira dos filmes de fantasia. O pior é que depois também fico com o dedo sujo de tinta...
No meu top de canetas que possuo, está em primeiro lugar, é mesmo um sonho. E um sonho acessivel, baratinho. Isto até ter sido retirada do mercado, o que aconteceu passado pouco tempo, para nunca mais voltar.
Anos mais tarde, fiquei com medo de a perder, de se partir, de se estragar e iniciei uma procura por um segundo exemplar - procura não muito intensiva, mas que ainda assim durou uns anos. Nas papelarias e lojas de canetas por onde passava era impossivel encontrá-la. Quando viajava, se passava num centro comercial ou num armazém com canetas, ainda deitava um olho a ver se a via, mas sem sorte. Com a descoberta do ebay, fiz algumas procuras nos leilões, mas não estava fácil, havia muito poucos e não enviavam para Portugal. Até que finalmente fez-se luz! Quando e onde menos esperava.
Estava eu um dia no Tagus Park à porta da tabacaria à espera do Rui, já estava lá à uns minutos quando olho para a montra e após uns segundos como que se materializaram à minha frente. Um expositor que tinha umas 4 ou 5 Rotring Rive no meio de outras tantas canetas de outra marca. Apesar de na altura passar por lá quase diariamente, nunca as tinha visto antes, foi como que um milagre. Fiquei logo em pulgas, saltei para dentro da loja e já não descansei enquanto não me venderam todas elas. Umas eram rollerball e as outras era de aparo. Na pressa, não reparei mas um dos aparos estava dobrado, e as rollerball nem tinham cargas. Nunca escrevi com elas, mas o medo passou-me. Continuei sempre e continuo a usar a original. Sem medos.
Acho que o meu único medo, o momento que me deixa sempre apreensivo, surge quando...